Deus criou a água, depois botou-lhe o sal, prantou-lhe
os peixes, dispôs-lhe as algas, mas foi o filho da lama,
o nu, o pequenino, aquele que juntou os troncos,
pregou os ramos, dos panos fez as velas, e chamou
mar ao mar, terra à terra, e viagem à longa travessia que
desenhou entre ele e ela. O que alcançou e conheceu,
cheirou, provou, cuspiu e nomeou. Nasceu, morreu, deixou.
Tantos foram os viajantes quanto as línguas neste mundo.

Entretanto, eis que regressou o Eterno, irmão gémeo da totalidade,
e disse Ocean, Harbour, Sailor, City, Continent, e a si mesmo se chamou
Lord Of Water And Wind, como se o mundo fosse apenas um.
Salt, Fish, Algae, disse. This Lord Blesses You.

Ignorância do passado, imprevidência do futuro.
Pouco ou muito, tudo o que sei direi.

Todo aquele que foi ao mar e chamou vento ao vento, e astros às estrelas,
e nelas gravou palavras juntamente com dedadas de sangue e
de tormenta, possui um dicionário do mundo irmão das coisas
existentes, e de suas sombras e aparências. Numerosas são as folhas
deste livro, querida língua, pedaço de carne comovida que nos une.
Fomos, somos e seremos muitos. Retirai da vida a Língua Portuguesa
e o diâmetro da Terra ficará mais curto.