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Raízes - Miguel Real


O 25 de Abril de 1974: Um Dia Puro

2014-04-15 00:00:00

É impossível pensar no dia 25 de Abril de 1974 sem ser possuído por um duplo sentimento: por um lado, o do júbilo, pelas realizações alcançadas no campo social, no campo económico, no campo urbanístico, no campo da ciência, enfim, em todos os campos que perfazem a totalidade da sociedade portuguesa, que sofreu um dos maiores impulsos de progresso de toda a sua já longa história; por outro e simultaneamente, ser totalmente inundado por um sentimento de pesar, pelo que se poderia ainda ter realizado no sentido de uma ética comunitária e não ser forçado a viver um autêntico regresso civilizacional nos costumes e na organização do Estado a que assistimos actualmente.

De facto, o dia 25 de Abril concentrou em si todas as qualidades ou virtudes éticas positivas desenvolvidas pela Civilização Ocidental: generosidade, liberdade, igualdade, solidariedade, fraternidade, bondade racional na relações com os outros, isolando o mal social de um grupo militar e político tão frágil e minoritário que desabou sem protestos audíveis. Neste sentido, o 25 de Abril foi, de facto, um dia puro, cheio de virtudes, ausente de manifestação de vícios e perversões, que recomeçariam mais tarde, criando a divisão, a desunião e o conflito entre grupos. Mas não no dia 25 de Abril, cuja explosão festiva foi recebida em todo o país como uma autêntica expansão de liberdade individual.

Deste dia puro, nasceu todo o bem celestial que inundou Portugal – a contenção nas divisões entre classes sociais, a universalização das pensões de reforma, o serviço nacional de saúde, a escola pública gratuita de qualidade, a consolidação de vencimentos razoáveis, o aumento da esperança média de vida, a vacinação geral das crianças, o recuo da tuberculose e do raquitismo para níveis mínimos, a protecção na velhice, enfim, a garantia para um pai e uma mãe de que terão pão sobre a mesa para os filhos, escola para os filhos, que estes no futuro terão direito a um salário decente e não serão explorados como novos escravos, a garantia de que os hospitais os acolherão em futura doença … Com efeito, as ondas de choques deste dia puro promoveu um estado geral de bem-estar e de prosperidade como nunca houvera em Portugal.

Porém, verdadeiramente, a pureza não é deste mundo, e rapidamente a cisão e o conflito tomaram conta da sociedade portuguesa, iniciando-se, a partir da década de 1990, um retorno a antigos estados de pobreza e de exploração, próprios do Terceiro Mundo. Uma elite histórica e culturalmente ignorante, comandada há 25 anos pelo Prof. Cavaco Silva, utilizando modelos económicos estranhos à cultura portuguesa, tem vindo, desde há cerca de 1o, 15 anos, a fazer retroceder o país para níveis de desigualdade social e de pobreza económica que se presumiam definitivamente superados.

Hoje, 40 anos depois do 25 de Abril de 1974, em nome de um estado liberal, temos a maior carga fiscal de sempre, que afoga as famílias de classe média e premeia a especulação financeira, o lastimoso espectáculo de quase um milhão de desempregados (verdadeiramente, 1,4 milhões), 660 mil famílias que não conseguem pagar empréstimos à banca, mais de 2,7 milhões de pessoas no limiar da pobreza, que, sem os apoios sociais do Estado, atingiria a cifra astronómica de 4 milhões, 250 000 novos emigrantes desde 2011…

Do dia Puro, hoje já registado na história de Portugal, transitámos abruptamente (em 40 anos) para um autêntico inferno.

Viver hoje em Portugal tornou-se no autêntico jogo infernal de quem desconhece as surpresas do futuro e não possui uma classe política e governamental honesta e sólida, que dê garantias de defender as populações mais carenciadas. Hoje, cada português apenas pode contar consigo próprio, sabendo que, por mais que trabalhe, caído entre oportunistas e carreiristas, extorquida pela máquina fiscal do Estado, nunca conseguirá atingir uma vida próspera.

Não admira, portanto, que os jornais noticiassem, recentemente, que a maioria dos estudantes do ensino básico já só pensa em emigrar. Fazem eles bem…


Miguel Real.

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